Lobby por agrotóxico na Anvisa é um inferno, diz ex-gerente
por Tiago Mali
Crédito:
Marcelo Min/Editora Globo
Luiz Cláudio Meirelles, ex-gerente de toxicologia
da Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa) foi exonerado do cargo em novembro
de 2012 quando denunciou um esquema de corrupção para aprovar 7 princípios
ativos de agrotóxicos mais rapidamente. Nesta entrevista, ele relata como era a
abordagem para que se apressasse as aprovações e diz que vê sua saída como algo
já desejado há muito tempo pela bancada ruralista do congresso.
GALILEU: Quanto tempo você ficou na Anvisa?
GALILEU: Quanto tempo você ficou na Anvisa?
Treze anos e meio. Cheguei lá em fevereiro de 1999 e sai de lá em
novembro de 2012.
Como as coisas funcionavam lá?
A Anvisa estava para ser criada em 1999 e eu fui
convidado pra organizar a gerência de toxicologia [que cuida da avaliação de
agrotóxicos] ,ela não existia ainda. O nosso olhar sobre essa questão era uma
avaliação preventiva. Você vê os problemas relacionados àquela substância antes
de ela ir pro mercado, e evitar que exista algum risco ou algum dano saúde da
população, e também pensa em questões de controle. Por exemplo, monitorar os
resíduos de agrotóxicos em alimentos, melhores informações sobre os agravos
provocados por esses produtos, melhoria da notificação de intoxicações, rever
substancias autorizadas no passado que já estavam no mercado quando a gente
chegou.
Você organizou esse setor lá?
Você organizou esse setor lá?
Sim. E o objetivo era uma ação dinâmica. Quando
você fala de substância química, elas estão sendo estudadas permanentemente. E
às vezes uma coisa que era considerada segura no passado, dependendo dos
estudos que apareçam, pode não ser mais considerada segura e você ter que mudar
a decisão. Por exemplo, o DDT. Quando foram lançados ali pela década de 1970
eram a maravilha do mundo. E depois eles passam a ser hoje, combatidos no mundo
inteiro. Descobrimos que causam câncer, se acumulam no tecido adiposo, que
contaminam o lençol freático. Por isso temos nessa área constantemente de rever
nossas decisões. Mesmo porque quem avalia as substancias são as empresas, né,
elas são donas das moléculas, elas que apresentam estudos, e nesse início da
entrada de molécula em qualquer país, os pesquisadores independentes não tem
acesso àquela substancia pra desenvolver estudo. Então o trabalho da gente tinha
esse escopo de prevenção com base em dados.
Essa prevenção é bem feita hoje?
Essa prevenção é bem feita hoje?
A gente sabe que no Brasil a produção de dados em
relação a essas contaminações da população ainda é extremamente precária. Pouco
se investiga, poucos são os programas de monitoramento que temos operando, como
o PARA [Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos]. Existe
monitoramento de água potável, mas a gente não encontra os dados. Devia existir
pra todo tipo de alimento. Processado, de origem agropecuária, água de
ambiente, agua potável, pra que pesquisadores e gestores pudessem tomar sua
decisão. Muitas vezes você se depara com uma substância química nova e o estudo
não te dá clareza sobre produção de câncer ou alteração de embrião. Enquanto o
órgão avaliador e de proteção sanitária você deve impedir a exposição até que
isso se esclareça, mas essa é uma questão muito polêmica no país.Tem essa
questão do poder de fogo que as empresas do agronegócio têm. Aos olhos deles, a
precaução é tida como algo xiita, ideólogo, radical.
Mas o controle é bem feito?
Mas o controle é bem feito?
Olha, faltam programas de monitoramento, de
resíduos, programas de capacitação, tanto de profissionais de saúde quanto dos
próprios agricultores. Os agricultores precisam ser mais bem informados sobre o
perigo das substâncias que eles manipulam. Os profissionais de saúde em como
atender um intoxicado, como tratar uma intoxicação. Precisamos também monitorar
resíduo de água, de solo. São informações importantes pra tomadores de decisão
no momento de avaliação.
Por que esse monitoramento não é feito?
Por que esse monitoramento não é feito?
Falta de recurso, falta de estrutura dos órgãos,
falta de laboratório. O Para, por exemplo. A gente fez logo no inicio da
Anvisa, começou com 4 estados e 3 laboratórios na ocasião, e a gente começou a
estruturar os laboratórios e trazer as vigilâncias sanitárias estaduais pra
perto, porque na verdade o papel de monitoramento envolve os estados. Ao longo
de 10 anos conseguimos alcançar o país todo. E qualificar 4 laboratórios
públicos no Brasil que monitoram resíduos com muita qualidade, pra evitar
questionamento judicial, e uma série de outras questões. Esse processo lento se
repete em várias áreas.
O que precisaria?
O que precisaria?
Precisaria ter análise de resíduo de agrotóxico em
água, em alimento processado, em águas profundas, no solo.. Não saberia estimar
quantos laboratórios mais seriam necessários. Um país que usa agrotóxico como o
Brasil precisa ter uma estrutura pra que a sociedade monitore a qualidade do
ambiente em que ela vive, e isso ainda é bastante precário. Se não tenho isso,
minha discussão com o setor regulado fica muito precária. Não é discussão
qualitativa que você olha nesse aspecto, é levar porrada.
Você sofria muita pressão na Anvisa? Como o lobby
funcionava?
Olha, tem varias maneiras. A estratégia das empresas
vai desde desqualificar o nosso trabalho, dizendo que o setor não tem
capacidade de fazer aquilo. Por exemplo, a reavaliação de agrotóxico [processo
que revê liberação de agrotóxicos já aprovados para ver se eles não estão
causando nenhum dano] que eles diziam que a gente não tinha capacidade. E
depois a pressão política através dos deputados, senadores que muitas vezes têm
suas campanhas financiadas por esse segmento e acabam tendo que dar uma
resposta e procuram a instituição pra questionar o trabalho, por que proibiram
aquele produto, por que não liberou aquele.
Era muito comum políticos procurarem vocês?
Era muito comum políticos procurarem vocês?
Bastante. Durante todos os anos que estive lá, a
maior parte dos políticos que procurou na Anvisa enquanto eu era gestor era pra
saber dos processos. Pra reclamar de atraso na avaliação e reclamar da
reavaliação que proibiu produto tal e que isso ia prejudicar a produção. Poucas
e raras vezes um politico procurou. O lobby do setor também vai pra Justiça
tentar derrubar nossa decisão.
Você diz isso à respeito da reavalição?
Você diz isso à respeito da reavalição?
Sim. No Brasil, agrotóxico é registrado para
sempre. A única maneira do Estado intervir nessa situação é ter em conta que o
conhecimento avança, novos dados surgem, as substâncias passam a ser proibidas
em outros países. Quando a gente chamou uma reavaliação de 14 ingredientes em
2008, houve toda a pressão política para não permitirem isso. Depois, tentaram
via judicial e conseguiram uma liminar que parou esse trabalho por um ano. Não
queriam que houvesse revisão de substâncias que estão sendo proibidas inclusive
na China, proibidas já na Europa, EUA, e amplo uso no Brasil. Derrubamos a
liminar, mas o processo foi atrasado em uma ano [das 14 substâncias que
começaram a ser reavaliadas em 2008, apenas 5 tiveram decisão final até agora,
com 4 banimentos]. A gente tem um Estado que vive oscilando nessa questão.
Gente competente dentro do governo tem, não é pouco não. Só que esbarra nesse
inferno, muitas vezes institucional, desses acordos que os políticos fazem, do
financiamento de campanha. Nada disso tá desligado. Quem indica um diretor da
Anvisa é o Senado. Uma coisa empurra a outra, não tem jeito.
Como funcionava isso?
Se você pegar o processo do metamidofós
[ingrediente ativo de agrotóxico barrado após ser reavaliado] vai ver o horror
que foi aquilo. A empresa pressionou de tudo quanto é maneira. Mandou carta pra
tudo que é político, dizendo que a gente tava desempregando gente, piorando a
agricultura, e por ai foi até que o próprio escritório deles abandonou o uso.
Quais eram os políticos que mais apareciam por lá?
Eu teria que verificar o nome pra não ser leviano
contigo. Mas normalmente os políticos da bancada ruralista.
Não lembra de nenhum?
Não lembra de nenhum?
Tinha o Gonzaga Patriota (PSB-PE), o Alex Canziani
(PTB-PR)... Esse Gonzaga Patriota chegou a pedir meu cargo várias vezes, pra me
substituir, por 2005... Mandava indicação, pra me tirar do cargo pra botar
fulano. O que gente sofre muitas vezes dentro do órgão publico, não tá
desvinculado de uma estratégia politica maior.
Havia pressão direta das empresas dentro da Anvisa?
Havia pressão direta das empresas dentro da Anvisa?
Elas nunca pressionam diretamente, são recebidas em
audiências. É direito pedir audiências com o diretor, como pediam também
comigo. Então eles questionavam e, às vezes ameaçavam quando se viam
prejudicados... E eu sempre dizia, se você se sente prejudicado tem o direito
de ir pra Justiça. Nem sempre é uma relação tranquila, a empresa que investiu
pesado no produto e você tem que barrar o seu pedido. Mas de maneira geral a
relação é cordial. Atendíamos com toda reserva. Sempre fui muito cuidadoso. A
Anvisa criou um parlatório pra proteger os servidores. A gente tinha uma sala
onde a audiência era gravada, a fita ficava registrada. A pressão era nesse
sentido, da preocupação deles com a norma... Era legitimo.
Essas pressões estão relacionadas com as irregularidades que você apontou antes de sair?
Essas pressões estão relacionadas com as irregularidades que você apontou antes de sair?
Não, não. O que eu apontei foi uma descoberta
interna de uma autorização. De um determinado caminho que o processo deveria
ter seguido que é a nossa rotina de trabalho e que não seguiu.
Mas isso não era do interesse de alguém?
Mas isso não era do interesse de alguém?
Por acaso descobri aquilo ali, verificando uma
situação que uma das gerentes que trouxe. Informei meus superiores, pedi
providências. Providência, quando você encontra uma situação de irregularidade,
é polícia e Ministerio Público. Também pedi a saída do gerente responsável por
isso. Isso gerou, inexplicavelmente e espero que um dia se explique, um
ambiente muito ruim. E o diretor logo depois de demitir a pessoa que eu tava
pedindo, me demite. Eu fui claro com eles: não vai me botar na mesma sacola,
das irregularidades. Não adianta elogiar o trabalho e falar que é assim mesmo.
Essa exoneração da maneira que aconteceu já era desejada há muito tempo, há
dois anos a pressão tinha aumentado muito.
Quem que desejava a sua saída?
A bancada ruralista,há muito tempo. Esse segmento
deseja que o setor saúde pare de avaliar os agrotóxicos. Já tem um projeto de
lei rolando, claramente jogando todas as atribuições pro ministério da
Agricultura. Pra mim essa questões tão mais no fundo das exonerações, mas elas
não foram ditas. Houve uma oportunidade em relação à situação, que gerou um
mal-estar e o sujeito lá agiu dessa maneira.
O que, na sua opinião, motivou as irregularidades?
O que, na sua opinião, motivou as irregularidades?
As instituições têm fragilidades, se identifica um
canal e se entra por ele... As motivações são sempre aquelas: benefício
pessoal, alguém que pode estar influenciando externamente, um apoio de
empresa... Isso que eu gostaria de ver investigado.
Foram sete aprovações de agrotóxicos sem avaliação
técnica apropriada?
Identifiquei sete.
É possível que haja mais?
É possível, é claro. Fui exonerado logo depois que
descobri o sétimo. E desde então não sei se alguém continuou investigando.
Coordenador de campanha contra os
pesticidas diz que mudar foco de crédito para a agricultura familiar poderia
reduzir uso de químicos
por Tiago
Mali
A matéria de capa da Revista GALILEU de setembro
mostra uma série de problemas enfrentados por agricultores brasileiros
relacionados ao uso de agrotóxicos. Denúncias como as presentes na revista
mobilizaram cerca de 50 entidades e movimentos sociais, que incluem
instituições como a Fiocruz, o Inca e o MST, em torno da Campanha Permanente
Contra os Agrotóxicos e Pela Vida.
Nesta entrevista, o coordenador da campanha, Cléber
Folgado, fala da pressão política pelo banimento de substâncias proibidas em
outros países e sobre as disputas travadas pelo movimento contra o agronegócio
e a indústria química. GALILEU: Como começou a Campanha Contra os Agrotóxicos e Pela Vida?
Começou em abril de 2011, mas isso já é debatido
faz tempo por movimentos sociais do campo. Nossa ideia é chamar atenção para os
problemas de saúde, econômicos e ambientais que estão relacionados ao consumo
excessivo de agrotóxicos no Brasil.
A proposta é banir todos os agrotóxicos?
São vários problemas que identificamos de pessoas
com os agrotóxicos e também tem especialistas mostrando que não há nível seguro
de exposição a eles. Então, o ideal seria não permitir mais usar agrotóxicos,
mas é claro que isso seria gradual. É preciso primeiro passar por um processo
de mudança de modelo de agricultura. Hoje o Brasil privilegia o agronegócio,
dando muito mais crédito à monocultura para a exportação do que à agricultura
familiar. Essa monocultura precisa de muito agrotóxico para ser produtiva; a
agricultura familiar, não, pode usar técnicas de agroecologia. Aideia primeiro
é banir a utilização dos agrotóxicos perigosos já banidos nos outros países [desde
2008, a Anvisa começou a reavaliar se deixa no mercado 14 substâncias proibidas
em outros países mas ainda liberadas no Brasil; dessas, até agora, apenas 5
tiveram resultados publicados, com 4 proibições]. O objetivo de não usar mais
agrotóxicos na agricultura como um todo seria mais a longo prazo.
Daria para produzir alimento em quantidade sem
eles?
Há uma falácia do agronegócio que diz que sem
agrotóxicos não teria alimento barato para a população, que teria fome no
mundo, a própria Kátia Abreu diz isso. Isso é uma mentira, uma chantagem. Hoje,
a agricultura familiar produz 70% da comida que chega à mesa dos brasileiros, e
faz isso com pouco veneno. De acordo com o Censo agropecuário do IBGE, apenas
30% das pequenas propriedades usam agrotóxico. Das grandes propriedades, são
80%. O que acontece é que a soja e o milho produzidos com muito agrotóxico
acabam sendo exportadas como ração pra China. Se a agroecologia tiver os mesmos
incentivos que os agrotóxicos, não vai subir o preço dos alimentos pro brasileiro.
E quais problemas de saúde chegam até a campanha?
E quais problemas de saúde chegam até a campanha?
Primeiro são as intoxicações agudas: aquelas
imediatas, ou pela alimentação contaminada com algum resquício de agrotóxico ou
por conta do camponês entrar em contato direto na hora em que está aplicando do
produto. Isso é muito recorrente, vem muito trabalhador rural entrar em contato
se queixando disso. Daí vem várias coisas: dor de cabeça, vômito, diarréia. Mas
esse não é o principal problema. O principal problema são as intoxicações
crônicas. São pequenas quantidades de agrotóxico que vão se acumulando no
organismo ao longo dos anos e às vezes com 5, 10, 15 anos, isso varia de
organismo para organismo, dá problema. Aí tem várias doenças. Por exemplo,
infertilidade masculina, muito comum, ou má formação das crianças. Em Lucas do
Rio Verde (MT) pesquisas encontraram até sapos com má formação. Um outro
problema muito grave é o câncer.
Tem identificação de casos de câncer?
Na nossa avaliação, esse tem sido um dos principais
problemas. Tem havido um crescimento absurdo dos casos de câncer no Brasil.
Alguns dos agrotóxicos mais utilizados no país, como o glifosato, são
cancerígenos. Nós temos identificado que nas regiões camponesas onde há um alto
uso de agrotóxico, tem uma alta taxa de câncer.
Por exemplo?
Isso foi identificado no relatório do deputado
federal Padre João. O Relatório, feito em 2011 dentro da Subcomissão de
Seguridade e Família na Câmara, identificou que em Unaí (MG), uma das regiões
com alta aplicação de agrotóxico, tem dados de constatação de casos de câncer
muito superior à média nacional.
Mas há comprovação de que esses casos se devem aos
agrotóxicos? Essa relação direta é difícil de estabelecer, não?
Há um problema aí, que gera discussão entre os
cientistas. Por que, ao mesmo tempo em que tem profissionais da saúde que fazem
essa relação, há outras pesquisas que dizem que não tem. Mas existem, sim,
estudos mostrando um aumento de casos. Alguns deles estão no dossiê sobre os
agrotóxicos da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco). Também há uma
região no Ceará de alto uso de agrotóxicos, na chapada do Apodi, onde há
pesquisas mostrando esse aumento de câncer na população. Além disso, o
Instituto Nacional do Câncer (Inca) divulgou um relatório que faz a relação
entre o uso de agrotóxico e câncer no Brasil.
Como está a discussão do ponto de vista político?
Em 2011, tivemos um primeiro grande aceno do
governo à nossa causa. Durante a marcha das Margaridas, a presidente Dilma
anunciou que iria construir um grupo de trabalho interministerial para pensar o
que ela chamou de plano nacional de enfrentamento dos agrotóxicos e dos seus
impactos na saúde e no meio ambiente. A pauta, que ninguém queria assumir nos
ministérios, ficou sob a responsabilidade do [ministro da Secretaria-geral da
presidência] Gilberto Carvalho. Houve uma primeira reunião na qual ficou decidido
que eles iam usar as informações do relatório aprovado pela subcomissão da
Câmara, para pensar políticas sobre o tema dos agrotóxicos. O grande problema
foi que não houve mais uma reunião depois disso.
Em que pé estão essas disputas de vocês?
É importante entender que a política do governo pra
agricultura prioriza o agronegócio. É aquela coisa de dizer que o agronegócio é
muito importante pra economia porque é responsável por 40% das exportações,
informação, inclusive, questionável. Mas, enfim, dentro dos últimos governos
andaram políticas que beneficiam o agronegócio em relação à utilização de
agrotóxicos. Por exemplo, tivemos proibição de um tipo de pulverização aérea de
agrotóxicos que afeta as abelhas, mas logo depois, o agronegócio conseguiu reverter
a proibição.
Do ponto federal, nos últimos anos o agronegócio
vem tendo vitórias e nós, derrotas. Nos municípios, temos tido algumas
vitórias. Conseguimos alguns municípios do interior, no Espírito Santo, no
Ceará, aprovar leis para proibir a pulverização aérea, a capina química no
perímetro urbano. Em Rondônia usam agrotóxicos para matar plantas nas
escolinhas, e conseguimos ter essa proibição. Há uma outra disputa muito
importante em curso, sobre o órgão de avaliação de agrotóxicos.
Qual é essa disputa?
A liberação do agrotóxico hoje é de
responsabilidade de três órgãos. Do ponto de vista da saúde, a Anvisa; do meio
ambiente, o Ibama; e da eficácia agronômica, quem avalia é o Ministério da
Agricultura Pecuária e Abastecimento (Mapa). Cada um dos órgãos tem que dar um
parecer. Em algumas audiências realizadas no Senado, a Anvisa diz que teve
dificuldades de fazer o processo de avaliação porque o Ibama atrasa. O Ibama
vem e diz que o problema é do Mapa, que diz que o problema é da Anvisa. Fica um
empurrando a culpa por outro. Por conta disso, se iniciou um debate no Senado
sobre a necessidade de criação de uma agência só para cuidar de agrotóxicos. E
que essa agência ficaria sob responsabilidade do Mapa, que, querendo ou não, é
o ministério do agronegócio no Brasil.
Eu participei de uma audiência pública dizendo o
problema não era a atuação da Anvisa. A agência tem uma atuação séria, mas
falta de profissionais. No Brasil, eram 46 pessoas pra cuidar isso enquanto nos
EUA são mais de 800. Além disso, tem o problema das denúncias que foram feitas
no ano passado.
As do Luiz Cláudio Meirelles, ex-gerente de
toxicologia da Anvisa?
Isso. Ele constatou que havia uma pessoa dentro da
agência que estava falsificando pareceres de aprovação de agrotóxicos e enviando
isso pra empresas e para o Ibama pra acelerarem o processo no outro órgão. O
Luiz Cláudio descobriu as irregularidades em agosto de 2012, e, até novembro, o
presidente da Anvisa não havia feito nada. O Luiz Cláudio acabou colocando isso
no Ministério Público e, em função disso é demitido. O resultado é que ficou
fortalecida a ideia de que a Anvisa não está funcionando, o que ajuda na
articulação de um órgão que centraliza as aprovações.Ficamos sabendo que a Casa
Civil começou a montar um grupo interministerial pra pensar como construir essa
agência única de agrotóxicos no país.
E essa agência única não seria mais eficiente?
E essa agência única não seria mais eficiente?
Somos extremamente contrários à nova agência. Não
achamos que o governo precisa inventar a roda. Não precisa inventar nada. Isso
não vai resolver o problema, que está na estrutura que esses órgãos
responsáveis hoje têm pra fazer os trabalhos deles. Eles não têm recursos para
pesquisa, quase não têm profissionais destinados a essas áreas de avaliação.
Uma nova agência seria, na verdade, um instrumento que vai tirar as atribuições
da Anvisa pra facilitar liberação de agrotóxicos.
A Anvisa tem sido uma pedra no sapato do
agronegócio porque tem tido papel importante na fiscalização e denúncia das
contaminações de agrotóxicos. Também foi importante na reavaliação dos
agrotóxicos já aprovados, mas que são muito perigosos, embora isso esteja
demorando. A criação dessa agência avaliadora subordinada ao Mapa só serviria
para facilitar a aprovação de mais substâncias perigosas. O que o governo precisa
fazer é reestruturar a Anvisa. A legislação brasileira de agrotóxicos é boa. O
problema é que a maior parte do que está no papel não é cumprido ou cumprido
apenas pela metade, porque o Estado não oferece condições para as agências
fiscalizarem.
“Pesquisas
contra agrotóxicos tem viés ideológico”
Diretor da associação que representa a indústria de agrotóxicos
critica pesquisas sobre efeitos das substâncias na saúde e diz que estrutura de
regulação no Brasil é ruim
por Tiago
Mali
Divulgação:
Andef
Para Eduardo Daher, diretor-executivo da Andef
(Associação Nacional de Defesa Vegetal), há viés ideológico em estudos que
mostram impactos dos agrotóxicos na saúde. O representante das principais
fabricantes de agrotóxicos no país reclama do tempo de liberação dos
agrotóxicos e afirma que, apesar dos erros que resultaram na contaminação de
uma escola rural na cidade de Rio Verde (GO), há segurança para aplicação das
substâncias no Brasil.
GALILEU: A indústria reclama de uma avaliação muito lenta dos agrotóxicos. Quais são os problemas?
GALILEU: A indústria reclama de uma avaliação muito lenta dos agrotóxicos. Quais são os problemas?
O marco regulatório federal passa por 3 organismos.
É absolutamente normal, presumível, e internacional. A análise da eficiência e
da eficácia agronômica no Ministério da Agricultura, onde num passado remoto
cuidava-se de tudo. A análise do meio ambiente, que vem muito mais na década de
70, pelo Ibama. Ibama que, sabemos, tem problema de falta de estrutura, de
recurso. Eles ficaram em greve por 6 meses e tudo mais... E o terceiro é na
toxicologia, que passa pela Anvisa. Ora, quando você cria 3 guichês em 3 locais
diferentes, com 3 visões diferentes, até muito pouco tempo atrás com ideologias
também diferentes... é o prato feito para não andar. É dar morosidade a um
processo que deveria ser rápido.
Nenhuma queixa às três áreas. Mas como é que o EPA
[Enviroment Policy Angency] americano, é tudo no mesmo lugar? No Canadá, eu
bato numa porta e faço isso. No Japão passa por 10 organismos, mas é um sistema
japonês. Na Alemanha passa por 3 organismos, mas numa outra velocidade. Com um
detalhe. Num clima temperado, num inverno na Rússia, no Canadá, nos EUA, eles
têm a neve e o inverno rigoroso, que são um grande herbicida, inseticida,
fungicida e acaricida. Mas, no clima tropical do Brasil, que consigo fazer 2 a
3 safras por ano, eu tenho o bônus da produtividade por hectare maior que nos
outros países, e tenho o ônus das pragas, doenças e das ervas daninhas. E me
pergunta por que vocês venderam mais fungicidas aqui que nos EUA? A resposta é
simples: ferrugem asiática. Tomara eu tivesse ferrugem asiática na Argentina,
nos Estados Unidos e no Canadá, eu ia nadar de braçada na soja. Eu sei conviver
hoje com a ferrugem, mas precisa usar fungicida.
Está em discussão a criação de um órgão único pra
concentrar isso.
Isso ajudaria muito. Não acho que seria a resolução
ou panaceia. Na indústria química, como em todo lugar, tem bons e maus
profissionais. Eu lidero empresas como a Bayer, a Basf, a Monsanto, a Syngenta,
a Dupont, a Dow... Esses caras não vão colocar em risco uma marca centenária
pra colocar no mercado um produto que tem a toxicidade que poderia ser
problemática. Na verdade, o que faz o veneno é a dose. O mesmo princípio ativo
do remédio está no herbicida, mas numa proporção maior. No caso dos defensivos
agrícolas — ou agrotóxicos, ou pesticidas, pra mim pouco importa a semântica —,
eu encaro como remédio pra planta. Você tem classificação toxicológica. Tem
agrotóxico tarja preta. Tem que ter receituário agronômico, visita do agrônomo.
Todo mundo faz correto? Não, tomara fizesse. Claro que um organismo único
ajuda, mas não é só isso.
O que, do ponto de vista da indústria, deveria
melhorar?
A extensão rural. Em 1990, o país salvou a Embrapa
e, numa canetada, enterrou a Embrater [Empresa Brasileira de Assistência
Técnica e Extensão Rural, extinta por Fernando Collor]. Então, tenho um monte
de conhecimento que não consigo levar para o pequeno produtor. A indústria fez
parte desse trabalho de levar conhecimento, mas não dá conta de tudo. E aí tem
o caso do cara do avião em Rio Verde [episódio em maio deste ano em que um
avião despejou agrotóxicos sobre uma escola rural da cidade goiana]. O cara tá
preso, pô. Na verdade, a indústria está cumprindo um papel que o governo não
está fazendo.
Nos EUA, a indústria química aceitou pagar mais
taxas e financiou uma melhoria dos órgãos de aprovação. Por que o mesmo não é
feito aqui?
Não sou expert no marco regulatório americano, mas
lá tem o Fast Track, pra fazer as coisas rápidas. No Brasil, esses três
organismos têm uma deficiência clara de estrutura. Outro dia foi publicado no
Valor Econômico que, pra liberar a fila da Anvisa [de espera para aprovação de
ingredientes ativos de agrotóxicos], seriam necessários 11,7 anos. Como que o
país que é hoje o segundo maior exportador de comida do mundo fica tanto tempo
na fila? É risível, pra não dizer que é ridículo.
E ainda a Fila no Ibama é ordem cronológica. A fila
no Mapa é por pragas emergentes que aparecem. Vide Helicoverpa [praga que tem
atacado lavouras de algodão na Bahia e causado prejuízos]. A minha maior aliada
hoje tem nome e sobrenome, Helicoverpa armígera. Ela deu um bilhão de prejuízo
e o governo não está conseguindo resolver. A burocracia é muito pior que a
Helicoverpa. E a métrica da Anvisa é muito pior. Não se sabe qual o critério
que eles colocam pra analisar primeiro uma ou outra substância.
É importante recurso, precisávamos de mais gente?
Sim, endosso isso. Mas será que não poderia criar um mecanismo de fast track?
Sim, é possível também. Então, pra mim, quando dá uma grande aflição, tem
liberação emergencial de substância, tem fast track, aí todo mundo sai correndo
porque o Brasil pode ter um grande prejuízo. Existe uma falta de recurso e
também uma falta de capacitação do recurso. Coloca um carinha lá que fez
farmácia, que não entende nada de planta, de erva daninha, de fungos e
bactérias. E no dia seguinte ele tem que analisar processos enormes em inglês,
que eu não sei se ele tem competência. É um problema de quantidade, de capacitação
e também de processo.
Mas a indústria estaria disposta a pagar mais por
isso?
Claro que tá. Mas agora pra dar pro governo, pra
pagar a taxa do governo pra não funcionar, que é o que tá acontecendo... Agora
há uma proposta de aumento pura e simples de tarifa que está surgindo como
projeto de lei. Pura e simplesmente pra contratar mais gente, e pra continuar
tendo a ineficiência que tem? No way. Tem que ter além de quantidade de gente,
capacitação de recurso humano, e processo. Tínhamos que estar automatizado.
Foi constatado aumento anormal de importação de
agrotóxicos em processo de reavaliação. O Brasil está virando mercado para os
produtos banidos em outros países?
Desde 1979 vão sendo retirados produtos, como o
DDT. Foram tirando produtos, por exemplo metamidofós e endossulfam, mas não se
coloca novas moléculas. A verdade é que o produtor rural fica desassistido.
Você deve perguntar ao cara do café se ele não tem saudade dos produtos que
controlavam o nematoide. Aí, ficam algumas opções mais caras e o produtor fica
queixoso. E outros, , sobretudo em área de fronteira, Rio Grande do Sul, Mato
Grosso e Paraná, começam a trazer do Paraguai, da Bolívia, do Uruguai... E aí a
gente sabe como é que acaba essa história.
Tô no mercado de agrotóxicos há 3 anos. Quando o
governo deu até o final dos estoques, tinha estoque pra caramba, é verdade. Até
porque, pela morosidade do Brasil, do problema logístico, que é trazido de
navio.
Mas no caso do paraquate, a importação quadruplicou depois que ele entrou em reavaliação
Mas no caso do paraquate, a importação quadruplicou depois que ele entrou em reavaliação
Aí tem outra coisa. A Basf colocou a última fábrica
dela na China, não coloca mais fábrica no Brasil. Por que lá é mais barato. A
indústria química no Brasil virou importadora. Se não tivermos segurança
regulatória, com a mídia divulgando as manifestações brasileiras, o cara vai
colocar a fábrica no outro lugar. Temos uns 3 exemplos de fábricas que
desistiram do Brasil e foram parar na China. Na minha opinião tem um efeito aí
econômico fazendo as pessaos olharem com mais carinho pra fora do que pro
Brasil. O Brasil, na economia, não é mais a bola da vez.Não sei quais eram os
estoques desses produtos, mas sou obrigado a dizer que isso tem mais a ver com
custo Brasil, com apagão logístico.
Pesquisas recentes da Fiocruz e do Inca dizem haver
indícios de uso de agrotóxicos sem controle causando danos a população.
Aonde está caminhando o dinheiro do agronegócio,
nos rincões do Mapitoba (Maranhão, Piauí Tocantins, Bahia), sobretudo no
Centro-Oeste, os IDHs e a expectativa de vida tem aumentado dramaticamente. Um
dos melhores lugares do IDH é Primavera do Oeste, é Lucas do Rio Verde, onde o
Wanderley Piganti cria teses de contaminação de todas mulheres do leite
materno. Eu confio zero nos trabalhos da Fiocruz com forte fundamento
ideológico e profundo envolvimento na Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos
e Pela Vida. Dados da Fiocruz pra mim têm a validade idêntica a do jornal que
eu leio todo dia.
Estive com o Dr. Ângelo Trapé recentemente no
Embrapa onde ele fazia uma apresentação e falava sobre isso. Tem aí um viés de
pessoas que de dia faziam a avaliação de agroquímicos e de noite estão
engajados na campanha permanente contra os agrotóxicos. Isso me autoriza a não
acreditar em tudo o que se diz aí. Acredito mais na Fundação MT, na Embrapa, no
Ipea e nos órgãos prevalentes sobre a produção agrícula do que a Fiocruz que
está no Rio de Janeiro com uma agricultura de minifúndio e um foco, que acho
válido, mas é de produção orgânica.
Mas no caso de Lucas do Rio Verde houve estudos
mostrando agrotóxicos na urina, no sangue, no leite materno, em sapos...
No leite materno, teve numa audiência pública, o
Pignati teve de reconhecer que errou dramaticamente. Tenho 3 ofícios da reitora
da universidade. Os trabalhos jamais foram publicados, esse trabalho tem erros
conceituais. E você acredita que ele analisou 60 nutrizes e deu indícios de
contaminação, inclusive com agrotóxicos que estão proibidos no Brasil há 25
anos, como o DHC? Na audiência pública o professor Eduardo Peixoto, fundador da
Fiocruz, desconstruiu essas historia do leite materno.
Além do leite, tinha uma série de outros estudos
mostrando contaminação de ar, de água. Em conjunto, eles não mostram que foram
cometidos excessos e uso sem controle?
Nós sabemos que podem haver excessos, mau usos e
descontrole. Mas voltamos ao capítulo da extensão rural. O que o governo tem
feito? Se você me der chance, posso começar a aplicar inseticida com robô. E
vou fazer a mesma coias que foi feita com a cana. Mas vou gerar um desemprego
gigante que vou colocar onde? Na porta do Wanderley Pignati? Na porta da
Anvisa? Acho que tem de ser feito um trabalho mais forte na educação. Você vai
pra MT, os tratores são cabinados, têm GPS. Há um controle fortíssimo da
aplicação. Nós estamos vendendo remédio para as plantas. Se usar de acordo com
a comercialização, é risco zero.
Mau uso existe em vários lugares? Claro que existe.
Mas nós temos um erro de foco. Ah, fala que tudo é o agrotóxico. Não tô dizendo
que não existam problemas. Mas existe, como tudo na vida.
Mas não há muito mau uso? Não falta fiscalizar?
Há falta de fiscalização, sim. Temos problemas de
contrabando, inclusive de crime organizado, de coisa que não passa pelo nosso
controle. Nós tínhamos que ter feito — e aí a indústria também tem a sua
parcela de culpa — em conjunto com o governo um trabalho de boas práticas
agrícolas. Boa parte disso poderia ter sido evitado com equipamento de
produção. Acho que a indústria poderia fazer mais e o governo também, pra ter
mais trabalho de educação pra evitar mau uso. Tanto na agricultura empresarial
quanto na agricultura familar.
Depois da tragédia que houve em Rio Verde...
Não houve tragédia nenhuma.
Mas várias crianças ficaram doentes...
Durante 8 horas. Teve problema dérmico,
respiratório ninguém mais está internado. É claro que aquele cara tem que estar
preso. O cara aplicou em cima da escola, o produto era pra soja ele aplicava em
milho, e o cara do avião fazia aplicação aérea com o produto pra aplicação
terrestre. Daí é uma sucessão de erros. Só queria corrigir a dramaticidade. Foi
uma tragédia, sim, mas pra reputação do nosso setor. Não houve tragédia maior,
graças a Deus, porque efetivamente a gente acompanhou, a empresa que detém o
produto fez um acompanhamento, e, claro, o Ministério Público está acompanhando.
Na verdade, estivemos lá. Três meses depois da
intoxicação, as crianças ainda têm sintomas e passam mal com frequência. Mas
minha questão é a respeito da mobilização política para banir a pulverização
aérea depois disso. Argumenta-se que na União Europeia, por exemplo, há
proibição.
Tem que tomar cuidado com isso. Na Europa é
diferente. Se você faz uma aplicação aérea em Luxemburgo acaba atingindo a
Itália. É claro que houve um erro aqui, todos têm que estar responsabilizados.
Do ponto de vista prático, a gente deveria estudar. A CNA, o secretário da
Agricultura e p Ministério Público de Goiás estão reanalisando esse processo e
acho que em algumas situações pode até haver um controle maior, e formas de se
criar o que os ingleses chamam de “proper zone”, você não pode fazer
pulverização aérea em certas áreas para que não haja perigo e problema.
Mas que dizer que isso de banir serve pro mercado
brasileiro... não podemos adaptar a agricultura de clima temperado para o caso
brasileiro. Você não consegue controlar a lagarta da soja e o percevejo em
grandes áreas de Mato Grosso sem uso de aviação agrícola. Mas é uma decisão
soberana. Se a sociedade brasileira não quiser mais a soja pra exportar e a
cana pra fazer etanol, coibindo práticas agrícolas de sucesso, fica à vontade,
voltamos para o açúcar de beterraba. Acho que os projetos de lei devem ser
estudados. Mas você tirar da agricultura fazer a aplicação aérea, é um crime
lesa-pátria. Vamos mexe na balança de pagamento. E mais: não fique preocupado,
quem vai comer essa soja é um porco na China.
Só que nem as especificações da lei não são
cumpridas.
Sim, precisaria ter uma fiscalização melhor. Uma
fiscalização maior. Além disso, precisaria do preventivo. Mais treinamento e
mais extensão.
A partir de 2009, a Anvisa fex uma série de
fiscalizações nas indústrias de agrotóxicos e encontrou produtos com fórmulas
adulteradas, datas de produção ou prazos de validade ultrapassados ou
ignorados. Algo foi feito para corrigi-los?
A indústria melhorou muito depois disso. Foi uma
atitude que pegou algumas empresas, mas houve uma melhora substancial nos
processos e na forma de fazer o trabalho na fábrica. E agora o Ministério tá
fazendo um trabalho junto a elas de boas práticas de fiscalização. Embora eu
esteja falando de indústrias de porte, com ISO 9000, ISO 14000... São empresas
químicas aparelhadas. Mas após as fiscalizações houve melhoras. Todo mundo se
readaptou. Foi um trabalho muito importante. A Anvisa voltou a fazer esse
trabalho, e mostra que funcionou.
Fiocruz e
Inca respondem acusações de que são ideológicas
Entidades produziram nota em
conjunto sobre acusações presentes na matéria de capa da edição de setembro da
GALILEU - confira
por
Redação Galileu
Confira abaixo, na íntegra, nota emitida pela
Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), pelo Instituto Nacional de Câncer José Alencar
Gomes da Silva (Inca) e pela Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco),
sobre a acusação de alguns entrevistados em relação às pesquisas que apontam
efeitos prejudiciais dos agrotóxicos, presentes na matéria de capa da GALILEU de setembro:
Uma
verdade cientificamente comprovada: os agrotóxicos fazem mal à saúde das
pessoas e ao meio ambiente
Historicamente, o papel da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), do Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (Inca) e da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) é de produção de conhecimento científico pautado pela ética e pelo compromisso com a sociedade e em defesa da saúde, do ambiente e da vida. Essas instituições tiveram e têm contribuição fundamental na construção e no fortalecimento do Sistema Único de Saúde.
Quando pesquisas desenvolvidas nas referidas instituições contrariam interesses de negócios poderosos, incluindo o mercado de agrotóxicos, que movimenta anualmente bilhões de reais, eventualmente elas sofrem ataques ofensivos que, transcendendo o legítimo debate público e científico, visam confundir a opinião pública utilizando subterfúgios e difamações para a defesa e manutenção do uso de substâncias perigosas à saúde e ao meio ambiente.
A Fiocruz, o Inca e a Abrasco não se eximem de seus papéis perante a sociedade e cumprem a missão de zelar pela prevenção da saúde e proteção da população. Por esta razão têm se posicionado claramente no que diz respeito aos perigos que os agrotóxicos e outras substâncias oferecem à saúde e ao meio ambiente. Desde 2008, o Brasil lidera o ranking de uso de agrotóxicos, o que gera um contexto de alto risco e exige ações prementes de controle e de transição para modelos de produção agrícola mais justos, saudáveis e sustentáveis.
As pesquisas sociais, clínicas, epidemiológicas e experimentais desenvolvidas a partir de pressupostos da saúde coletiva, em entendimento à complexa determinação social do processo saúde-doença, envolvem questões éticas relativas às vulnerabilidades sociais e ambientais que necessariamente pertencem ao mundo real no qual as populações do campo e das cidades estão inseridas.
Neste sentido, a Fiocruz, o Inca e a Abrasco estão seguros do cumprimento de seu papel. Portanto, repudiam a acusação de que são guiados por um “viés ideológico” e sem qualidade científica. As referidas instituições defendem os interesses da saúde pública e dos ecossistemas, em consonância com os direitos humanos universais, e firmados pelos princípios constitucionais que regem o Brasil.
A Fiocruz, o Inca e a Abrasco atuam há décadas em parceria com diversas universidades e institutos de pesquisas, como a Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT), em que atua o professor e pesquisador Wanderlei Pignati – citado em reportagem da revista “Galileu” mencionada abaixo –, e outros que desenvolvem pesquisas sobre os impactos dos agrotóxicos e de micronutrientes na saúde e no ambiente que são idôneas, independentes, críticas, com metodologias consistentes e livres de pressões de mercado. Tais pesquisas vêm revelando a gravidade, para a saúde de trabalhadores e da população em geral, do uso de agrotóxicos, e reforçam a necessidade de medidas mais efetivas de controle e prevenção, incluindo o banimento de substâncias perigosas já proibidas em outros países e o fim da pulverização aérea.
O “Dossiê Abrasco–Um alerta sobre os impactos dos agrotóxicos na Saúde” registra e difunde a preocupação de pesquisadores, professores e profissionais com a escalada ascendente de uso de agrotóxicos no Brasil e a contaminação do ambiente e das pessoas dela resultante, com severos impactos na saúde pública e na segurança alimentar e nutricional da população.
Os agrotóxicos podem causar danos à saúde extremamente graves, como alterações hormonais e reprodutivas, danos hepáticos e renais, disfunções imunológicas, distúrbios cognitivos e neuromotores e cânceres, dentre outros. Muitos desses efeitos podem ocorrer em níveis de dose muito baixos, como os que têm sido encontrados em alimentos, água e ambientes contaminados. Além disso, centenas de estudos demonstram que os agrotóxicos também podem desequilibrar os ecossistemas, diminuindo a população de espécies como pássaros, sapos, peixes e abelhas. Muitos desses animais também desempenham papel importante na produção agrícola, pois atuam como polinizadores, fertilizadores e predadores naturais de outros animais que atingem as lavouras. O “Dossiê Abrasco” cita dezenas dos milhares de estudos publicados em periódicos científicos nacionais e internacionais de renome que comprovam esses achados.
É direito da população brasileira ter acesso às informações dos impactos dos agrotóxicos. Faz-se necessário avançar na construção de políticas públicas que possam proteger e promover a saúde humana e dos ecossistemas impactados negativamente pelos agrotóxicos, assim como fortalecer a regulação do uso dessas substâncias no Brasil, por meio do SUS.
Nesse sentido, a Fiocruz, o Inca e a Abrasco repudiam as declarações do diretor-executivo da Associação Nacional de Defesa Vegetal (Andef), Eduardo Daher, e de Ângelo Trapé, da Unicamp, veiculadas na revista “Galileu” nº 266, edição de setembro de 2013, e também na entrevista divulgada no site da publicação, que atentam contra a qualidade científica das pesquisas desenvolvidas nessas instituições e, em especial, contra o “Dossiê Abrasco – Um alerta sobre os impactos dos agrotóxicos na Saúde”.
As palavras do diretor-executivo da Andef, que tentam desqualificar e macular a credibilidade dessas instituições, são inéditas, dado o prestígio nacional e internacional e a relevância secular que temos na área da pesquisa e formulação de políticas públicas de ciência, tecnologia e inovação em saúde, bem como na formação de profissionais altamente qualificados.
A Andef é uma associação de empresas que produzem e lucram com a comercialização de agrotóxicos no Brasil. Em 2010, o mercado dessas substâncias movimentou cerca de US$ 7,3 bilhões no país, o que corresponde a 19% do mercado global de agrotóxicos. As seis empresas que controlam esse segmento no Brasil são transnacionais (Basf, Bayer, Dupont, Monsanto, Syngenta e Dow) e associadas à Andef. As informações sobre o mercado de agrotóxicos no Brasil, assim como a relação de lucro combinado das empresas na venda de sementes transgênicas e venenos agrícolas, estão disponíveis no referido Dossiê Abrasco “Um alerta sobre os impactos dos agrotóxicos na Saúde”.
A Fiocruz, o Inca e a Abrasco não aceitarão pressões de setores interessados na venda de agrotóxicos e convocam a sociedade brasileira a tomar conhecimento e se mobilizar frente à grave situação em que o país se encontra, de vulnerabilidade relacionada ao uso massivo de agrotóxicos.
Rio de Janeiro, 06 de setembro de 2013
Historicamente, o papel da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), do Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (Inca) e da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) é de produção de conhecimento científico pautado pela ética e pelo compromisso com a sociedade e em defesa da saúde, do ambiente e da vida. Essas instituições tiveram e têm contribuição fundamental na construção e no fortalecimento do Sistema Único de Saúde.
Quando pesquisas desenvolvidas nas referidas instituições contrariam interesses de negócios poderosos, incluindo o mercado de agrotóxicos, que movimenta anualmente bilhões de reais, eventualmente elas sofrem ataques ofensivos que, transcendendo o legítimo debate público e científico, visam confundir a opinião pública utilizando subterfúgios e difamações para a defesa e manutenção do uso de substâncias perigosas à saúde e ao meio ambiente.
A Fiocruz, o Inca e a Abrasco não se eximem de seus papéis perante a sociedade e cumprem a missão de zelar pela prevenção da saúde e proteção da população. Por esta razão têm se posicionado claramente no que diz respeito aos perigos que os agrotóxicos e outras substâncias oferecem à saúde e ao meio ambiente. Desde 2008, o Brasil lidera o ranking de uso de agrotóxicos, o que gera um contexto de alto risco e exige ações prementes de controle e de transição para modelos de produção agrícola mais justos, saudáveis e sustentáveis.
As pesquisas sociais, clínicas, epidemiológicas e experimentais desenvolvidas a partir de pressupostos da saúde coletiva, em entendimento à complexa determinação social do processo saúde-doença, envolvem questões éticas relativas às vulnerabilidades sociais e ambientais que necessariamente pertencem ao mundo real no qual as populações do campo e das cidades estão inseridas.
Neste sentido, a Fiocruz, o Inca e a Abrasco estão seguros do cumprimento de seu papel. Portanto, repudiam a acusação de que são guiados por um “viés ideológico” e sem qualidade científica. As referidas instituições defendem os interesses da saúde pública e dos ecossistemas, em consonância com os direitos humanos universais, e firmados pelos princípios constitucionais que regem o Brasil.
A Fiocruz, o Inca e a Abrasco atuam há décadas em parceria com diversas universidades e institutos de pesquisas, como a Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT), em que atua o professor e pesquisador Wanderlei Pignati – citado em reportagem da revista “Galileu” mencionada abaixo –, e outros que desenvolvem pesquisas sobre os impactos dos agrotóxicos e de micronutrientes na saúde e no ambiente que são idôneas, independentes, críticas, com metodologias consistentes e livres de pressões de mercado. Tais pesquisas vêm revelando a gravidade, para a saúde de trabalhadores e da população em geral, do uso de agrotóxicos, e reforçam a necessidade de medidas mais efetivas de controle e prevenção, incluindo o banimento de substâncias perigosas já proibidas em outros países e o fim da pulverização aérea.
O “Dossiê Abrasco–Um alerta sobre os impactos dos agrotóxicos na Saúde” registra e difunde a preocupação de pesquisadores, professores e profissionais com a escalada ascendente de uso de agrotóxicos no Brasil e a contaminação do ambiente e das pessoas dela resultante, com severos impactos na saúde pública e na segurança alimentar e nutricional da população.
Os agrotóxicos podem causar danos à saúde extremamente graves, como alterações hormonais e reprodutivas, danos hepáticos e renais, disfunções imunológicas, distúrbios cognitivos e neuromotores e cânceres, dentre outros. Muitos desses efeitos podem ocorrer em níveis de dose muito baixos, como os que têm sido encontrados em alimentos, água e ambientes contaminados. Além disso, centenas de estudos demonstram que os agrotóxicos também podem desequilibrar os ecossistemas, diminuindo a população de espécies como pássaros, sapos, peixes e abelhas. Muitos desses animais também desempenham papel importante na produção agrícola, pois atuam como polinizadores, fertilizadores e predadores naturais de outros animais que atingem as lavouras. O “Dossiê Abrasco” cita dezenas dos milhares de estudos publicados em periódicos científicos nacionais e internacionais de renome que comprovam esses achados.
É direito da população brasileira ter acesso às informações dos impactos dos agrotóxicos. Faz-se necessário avançar na construção de políticas públicas que possam proteger e promover a saúde humana e dos ecossistemas impactados negativamente pelos agrotóxicos, assim como fortalecer a regulação do uso dessas substâncias no Brasil, por meio do SUS.
Nesse sentido, a Fiocruz, o Inca e a Abrasco repudiam as declarações do diretor-executivo da Associação Nacional de Defesa Vegetal (Andef), Eduardo Daher, e de Ângelo Trapé, da Unicamp, veiculadas na revista “Galileu” nº 266, edição de setembro de 2013, e também na entrevista divulgada no site da publicação, que atentam contra a qualidade científica das pesquisas desenvolvidas nessas instituições e, em especial, contra o “Dossiê Abrasco – Um alerta sobre os impactos dos agrotóxicos na Saúde”.
As palavras do diretor-executivo da Andef, que tentam desqualificar e macular a credibilidade dessas instituições, são inéditas, dado o prestígio nacional e internacional e a relevância secular que temos na área da pesquisa e formulação de políticas públicas de ciência, tecnologia e inovação em saúde, bem como na formação de profissionais altamente qualificados.
A Andef é uma associação de empresas que produzem e lucram com a comercialização de agrotóxicos no Brasil. Em 2010, o mercado dessas substâncias movimentou cerca de US$ 7,3 bilhões no país, o que corresponde a 19% do mercado global de agrotóxicos. As seis empresas que controlam esse segmento no Brasil são transnacionais (Basf, Bayer, Dupont, Monsanto, Syngenta e Dow) e associadas à Andef. As informações sobre o mercado de agrotóxicos no Brasil, assim como a relação de lucro combinado das empresas na venda de sementes transgênicas e venenos agrícolas, estão disponíveis no referido Dossiê Abrasco “Um alerta sobre os impactos dos agrotóxicos na Saúde”.
A Fiocruz, o Inca e a Abrasco não aceitarão pressões de setores interessados na venda de agrotóxicos e convocam a sociedade brasileira a tomar conhecimento e se mobilizar frente à grave situação em que o país se encontra, de vulnerabilidade relacionada ao uso massivo de agrotóxicos.
Rio de Janeiro, 06 de setembro de 2013
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