O Fórum de Mulheres das Vertentes (FMV) foi fundado em 2018 com o objetivo de congregar movimentos, instituições, coletivos e mulheres sem vínculos institucionais a projetos e ações feministas na Mesorregião do Campo das Vertentes. Com sede em São João Del-Rei (SJDR), tem hoje em sua formação parcerias de diferentes municípios, incluindo Tiradentes, Santa Cruz de Minas, Ritápolis, Barbacena e Lavras, contando com 84 participantes. Desde 2020 o Fórum adquiriu representatividade junto ao Conselho Estadual de Segurança Alimentar (CONSEA). Desde sua fundação, o objetivo do FMV foi articular coletivos, grupos e mulheres feministas da região das Vertentes, compondo uma frente feminista e antirracista capaz de elaborar e executar ações que minimizem os efeitos das desigualdades de gênero, raça e classe. No contexto da Covid-19, no final de março /2020, o FMV decidiu coletivamente constituir um grupo para organizar e contribuir para articulações em torno de “Ações de Solidariedade Social”. Assim, ao longo do ano, foram realizadas ações conjuntas com o Observatório da Saúde Coletiva/UFSJ e do GT Rua (projeto aprovado pela Fiocruz). Para tanto, foi criado um grupo de trabalho específico para tratar das ações de Solidariedade Social (GT solidariedade) do Fórum. As ações foram dirigidas inicialmente às mulheres que ficaram desempregadas em decorrência da pandemia ou exercendo trabalho informal, identificadas por companheiras participantes do FMV. Posteriormente as ações foram estendidas a comunidades mais vulneráveis no município de SJDR, das áreas rural e urbana, indicadas por mulheres do Fórum e/ou pessoas de referência dessas comunidades. O trabalho do GT solidariedade era feito, primeiro, com “escutas” telefônicas qualificadas às famílias, para maior proximidade com a realidade delas e para compreender suas demandas específicas. A partir dessa escuta, em um segundo momento, via doações, organizava-se cestas básicas às mulheres, chefes de família. Cabe ressaltar a importância dessa a escuta qualificada executada por um grupo de mulheres participantes do FMV que fornecia, mensalmente, cestas básicas compostas por itens alimentícios, de limpeza e de higiene pessoal de acordo com a situação de cada grupo familiar. Nessa ação, desde 27/03/2020, foram beneficiados 108 grupos familiares, totalizando 504 pessoas, e as demandas de apoio alimentar e de limpeza e higiene pessoal às famílias vulneráveis seguem aumentando com as complicações da transmissão comunitária da Covid-19 e da necessidade de isolamento social. Os recursos recebidos até o momento para essa ação específica foram adquiridos, em grande parte, por meio de doações recolhidas pelo Fórum junto à sociedade civil, aos editais de solidariedade realizados pelos sindicatos da UFSJ, SINDS e ADUFSJ e à Associação Adro Galeria. Estes recursos viabilizam a compra e distribuição de 339 cestas básicas, com média de custo de 200,00 cada. O acompanhamento da situação de cada grupo familiar permite, quando possível, responder outras demandas como, por exemplo, orientação sobre o auxílio emergencial; encaminhamentos e suporte caso haja situação de violência intrafamiliar; orientação sobre prevenção e precaução relacionada à transmissão do novo coronavírus e sobre o fluxo de atendimento à saúde nos casos de suspeita da Covid-19; assim como, constante avaliação da necessidade de continuidade do apoio prestado.
Paralelamente
a esses atendimentos, foram realizados levantamentos que vêm subsidiando as
orientações, atividades e propostas de projetos que possam contribuir para
reduzir impactos sobre a situação atual desta população, sobretudo relacionada
com a questão da segurança alimentar. Outra ação realizada pelo FMV foi a
execução do projeto denominado “Solidariedade em Tempo de Pandemia”, de julho a
início de dezembro de 2020, com recurso institucional oriundo de um edital da
FIOCRUZ. Com este projeto, o Fórum de Mulheres das Vertentes, representado pela
Ong Atuação, articulou uma rede de costureiras para a produção de máscaras e
também conseguiu ampliar o atendimento às famílias com cestas básicas,
incluindo população em situação de rua, em colaboração ao grupo de trabalho GT
Rua, parceiro externo ao Fórum. Assim, o Projeto “Solidariedade em Tempo de
Pandemia”, possibilitou a confecção e distribuição de 4890 máscaras, nos
municípios de São João del Rei, Santa Cruz de Minas e Tiradentes, para todas as
famílias escutadas, assim como distribuídas em locais de maior vulnerabilidade
social das cidades. O trabalho do Fórum neste momento tem sido justamente o de
pensar e articular outras relações entre as mulheres com fins de trabalho,
renda e segurança alimentar, sobretudo neste contexto da pandemia de COVID-19 e
do pós-pandemia. Das escutas às mulheres atendidas pelo FMV foram identificadas
aquelas que se posicionaram com interesses a possibilidades alternativas para
geração de renda. Uma das propostas que surgiu das demandas, foi o de se
fortalecer o trabalho com Agricultura Urbana, seja nos próprios quintais ou de
forma coletiva, em formato de Horta Urbana Comunitária. O Fórum de Mulheres traçou
inicialmente suas ações prevendo um tempo de cobertura de dois meses, tempo que
entendia ser suficiente para que o poder público municipal pudesse se
reorganizar e construir seu Plano de Ação para este momento emergencial.
Contudo, o coletivo está há 1 ano com as ações solidárias, ao passo que as
demandas familiares, pela ausência do Estado, se mantêm. Uma situação que
deveria ser breve, passa a exigir uma ação permanente. O fato de o FMV
trabalhar com escutas e demandas específicas de cada grupo familiar deixou
claro que a cesta básica padrão não corresponde às necessidades reais das
famílias. Ao apresentar especificidades nas conversas e levantamento de
demandas são observadas e consideradas as diferenças que cada grupo familiar
apresenta. Essa diferença pode ocorrer por cobertura de faixa etária e
restrições alimentares. O que tem ficado claro pelas atividades do FMV é que as
ações e recursos públicos que deveriam ser orientados no atendimento destas
famílias, não chegam ao destino necessário. A falta de transparência da gestão
pública com relação aos recursos da Assistência Social (benefícios eventuais em
períodos emergenciais), da Saúde e da educação (via kit alimentação) são uma
incógnita junto à administração pública municipal. Grande parte da população
tem sido negligenciada e muitas famílias geridas por mulheres com crianças e
dependentes têm passado necessidades. Entendemos que ações solidárias, em
momentos emergenciais como da pandemia, demonstram por parte do FMV e de muitas
outras organizações existentes no município, a capacidade de reconhecer,
solidarizar e buscar estratégias que possibilitem condições mínimas de
sobrevivência para uma parcela expressiva de nossa população que exerce
trabalho autônomo, informal e precarizado, mas também compreendemos que este é
um dever do Estado. O que se evidencia, entretanto, é a insuficiência da
atuação do Poder Público Local, que detém o dever constitucional de prestar
assistência social, conforme artigos 194, 195, 203 e 204 da Constituição
Federal de 1988. Diante desse quadro, estamos neste mês propondo às famílias
atendidas a construção de uma carta dirigida ao Ministério Público (MP)
exigindo que a Prefeitura Municipal cumpra os benefícios eventuais, das quais
elas têm direito, sobretudo neste período emergencial. Isso se torna ainda mais
urgente diante dos cortes no valor e na quantidade de famílias atingidas pelo
auxílio emergencial a partir de 2021, momento em há um agravamento da pandemia
e que somente com uma renda básica para essas famílias será possível realizar o
isolamento social necessário para seu enfrentamento. Nesse processo, o
entendimento do FMV sobre este período é o de que, sem ou com o recurso
emergencial, diversas famílias ainda estão em estado de vulnerabilidade e em
insegurança alimentar, sobretudo aquelas que permanecem sem e não conseguiram
acesso ao recurso, por questões excludentes e burocráticas.
Fórum de Mulheres das Vertentes, 15 de março
de 2021.
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