* Artigo da Comissão Permanente de Povos e Comunidades Tradicionais do Consea - MG
Alimentar-se não significa somente nutrir, mas também manifestar-se culturalmente. Representa a história, a identidade e o patrimônio cultural de um povo. Nesse contexto, é fundamental que políticas públicas, visando uma alimentação balanceada, em termos de quantidade e qualidade, estejam em consonância com a preservação cultural alimentar de um grupo.
Conforme o documento
Marco de Referência de Educação Alimentar e Nutricional para as Políticas
Públicas, publicado em 2012, pela Secretaria Nacional de Segurança Alimentar e
Nutricional pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, “o processo do sistema alimentar abrange a
produção, distribuição e consumo, como também as práticas alimentares
individuais e coletivas”. Ainda segundo o documento, “a alimentação brasileira, com suas particularidades regionais, é uma
das expressões do nosso processo histórico e de intercâmbio cultural entre os
diferentes povos que formaram nossa nação” (2012, p.25).
De acordo com Oliveira
(2019) “as populações do campo sempre
foram e serão as guardiãs da terra, das sementes e das práticas da relação
homem e natureza e em consequência, importantes para a contribuição na promoção
da agroecologia”. Para a
pesquisadora, “a culinária brasileira é
decorrente de patrimônios que foram construídos no Brasil pelas populações
indígenas, africanas, portuguesas e outras que vieram pra cá” (OLIVEIRA,
2019).
A Lei nº 11.346/2006
que institui Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional – PNSAN,
inclui articular programas e ações de diversos setores que respeitem, protejam,
promovam e provêm o direito humano à alimentação adequada observando as
diversidades social, cultural, ambiental, étnico-racial, a equidade de gênero e
a orientação sexual, bem como disponibilizar instrumentos para sua
exigibilidade.
A soberania alimentar é
um princípio crucial para a garantia de segurança alimentar e nutricional e diz
respeito ao direito que têm os povos de definirem as políticas, com autonomia
sobre o que produzir, para quem produzir e em que condições produzir. Significa
garantir a soberania dos agricultores e agricultoras, extrativistas, pescadores
e pescadoras, entre outros grupos, sobre sua cultura e sobre os bens da
natureza, bem como, na participação dos sistemas agroalimentares sustentáveis
socioeconomicamente.
A segurança alimentar e
nutricional demanda ações intersetoriais de garantia de: (1) acesso à terra
urbana, rural e território, (2) aos bens da natureza, incluindo as sementes,
(3) à água para consumo e produção de alimentos, (4) serviços públicos
adequados de saúde, educação, transporte, entre outros, (5) ações de prevenção
e controle da obesidade, (6) fortalecimento da agricultura familiar e da produção orgânica e agroecológica, (7)
da proteção dos sistemas agroextrativistas, (8) de ações específicas para povos
indígenas, populações negras, quilombolas e povos e comunidades tradicionais.
Conforme a Lei nº
11.346/2006, que cria o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional –
SISAN
A alimentação adequada é direito fundamental
do ser humano, inerente à dignidade da pessoa humana e indispensável à
realização dos direitos consagrados na Constituição Federal, devendo o poder
público adotar as políticas e ações que se façam necessárias para promover e
garantir a segurança alimentar e nutricional da população respeitando a
diversidade cultural, sob os âmbitos social, econômico, ambiental e cultural.
Conforme o inciso I Art.
3º Decreto 6.040 / 2007 - que institui a Política Nacional de Desenvolvimento
Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais — PNPCT (2007)
Povos e comunidades
tradicionais são grupos culturalmente diferenciados e se reconhecem como tais,
que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e usam
territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural,
social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e
práticas gerados e transmitidos pela tradição.
Ainda
de acordo com Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e
Comunidades Tradicionais – PNPCT, entre os PCTs do Brasil, estão os povos
indígenas, os quilombolas, as comunidades tradicionais de matriz africana ou de
terreiro, os extrativistas, os ribeirinhos, os caboclos, os pescadores
artesanais, os pomeranos, os faxinalenses, os de cultura cigana, os
seringueiros, as catadoras de mangaba, as quebradeiras de coco-de-babaçu, as
comunidades tradicionais pantaneiras, os caiçaras, os retireiros do Araguaia,
as comunidades de fundo de pasto, os geraizeiros, os caatingueiros, os
piaçabeiros, povos Carroceiros e Carroceiras, que tiveram certidão de
autodefinição aprovada pela Comissão Estadual de Povos e Comunidades
Tradicionais (CEPCT) no dia 25 de fevereiro de 2020 em plenária, segundo a
Associação dos Carroceiros e Carroceiras Unidos/as de Belo Horizonte e região
metropolitana, em Minas Gerais.
Todos
os Povos e Comunidades Tradicionais deveriam ter seus direitos resguardados por
diversas legislações, como pelos artigos 215 e 216 da Constituição Federal e
pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), vinculada à
Organização das Nações Unidas (ONU) da qual o Brasil é signatário, como também
por legislações como o Decreto 6040 de âmbito federal, de 7 de fevereiro de
2007, e da Lei estadual de Minas Gerais 21.147 de 14 de janeiro 2014.
A Política Nacional de
Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais (PNPCT) busca
garantir o reconhecimento e a sustentabilidade dos povos e das comunidades
tradicionais, por meio do fortalecimento dos seus direitos territoriais,
sociais, ambientais, econômicos e culturais, com respeito e valorização às suas
identidades, formas de organização e instituições.
O Conselho de Segurança
Alimentar e Nutricional Sustentável de Minas Gerais CONSEA-MG, intermediou a instituição de
mecanismos de realização do Direito Humano à Alimentação Adequada e de
políticas públicas afins como a criação do Instituto de Terras, para destinação
das terras devolutas para reforma agrária; a criação das políticas em lei como
a de desenvolvimento sustentável dos povos e comunidades tradicionais; a de
desenvolvimento rural sustentável da
agricultura familiar; da Comissão Estadual de Povos e Comunidades Tradicionais
e a aquisição de declaração de posse de terras devolutas e outras.
O Consea-MG conta com
as Comissão Permanente Povos e Comunidades Tradicionais (PCTs) para encaminhar
discussões e elaborar propostas para consideração no plenário em atendimento à
segurança alimentar e nutricional destes grupos.
O atual cenário que a
sociedade vivencia em decorrência da Covid-19, tem revelado o quanto as
políticas públicas de proteção destinadas à segurança alimentar e nutricional
dos Povos e Comunidades Tradicionais são urgentes. Além dessa perspectiva, a
preservação da cultura alimentar é fundamental para o fortalecimento e
resistência desses Povos que historicamente enfrentam grandes desafios
socioeconômicos, inclusive a preservação de nosso patrimônio alimentar
resguardado por nossa sociobiodiversidade.
*Este texto é uma iniciativa da Comissão Permanente de Povos e Comunidades Tradicionais do Consea-MG
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NOTÍCIAS. SAÚDE E CIÊNCIA PARA TODOS. Pesquisadora
fala sobre soberania alimentar e patrimônio cultural para a promoção da saúde e
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2021.
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PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. CASA CIVIL. SUBCHEFIA PARA ASSUNTOS JURÍDICOS. LEI Nº 11.346, DE 15 DE SETEMBRO DE 2006. Regulamento Cria o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional – SISAN com vistas em assegurar o direito humano à alimentação adequada e dá outras providências.. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11346.htm. Acesso em: 26 abr. 2021.
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